Revista Zimbro
by Amigos da Serra da Estrela
 
Psicóloga

2024-10-07

Editorial Setembro

Editorial Setembro

 

Palavras chave

editorial  
 

“Estas azinheiras no meio do caminho não têm de ser arrancadas?”

“Não. Cortadas.”

“Mas cortadas não voltam a crescer?”

“Por isso é que o percurso tem de ser mantido. Vai-se mantendo e depois é ver quem vence no tempo. Mas se fizerem isto que estão a fazer, claro que a azinheira vence.”

 

Dois anos após o incêndio que devastou grande parte da Serra da Estrela, em 2022, as serras da região continuam a ressentir-se. As encostas encontram-se negras e despidas dos troncos que ainda restam, ora queimados e mortos, ora retirados e não repostos. As montanhas estão abandonadas ao tempo, esquecidas.

O Vale do Beijames abrange os percursos da Abitureira e do Aguilhão, que, diga-se de passagem, constituem parte dos caminhos mais interessantes da região e permitem levar os mais curiosos a surpreendentes e desconhecidos lugares na Serra da Estrela. A qualidade destes caminhos é incontestável, pois agregam a tríade da Sustentabilidade – numa relação honesta entre os percursos e a sua utilidade, da Credibilidade – sob a forma de um trabalho de excelência, e do Respeito – pela natureza e pelas pessoas que nela passam.

A construção destes percursos teve como ponto de partida a diminuição do impacto do desnível da encosta, numa tentativa de atenuar o esforço de quem as percorre e, em simultâneo, oferecer a possibilidade de usufruto da paisagem. O segredo para bem apreciar estas veredas está nos detalhes – nas curvas e contra-curvas, que poupam os caminhantes de subidas íngremes; nas passagens estreitas, entre árvores e ribeiros; nos degraus, delicadamente construídos uns sob os outros; nos bancos estrategicamente bem posicionados, para que se possa admirar a paisagem que nos sorri a todo o momento; e, claro, nas sombras das árvores que tão bem vão acompanhando as pessoas ao longo de toda a experiência, como é o caso das azinheiras. Sim, porque não se trata apenas de uma vereda qualquer, mas sim de uma experiência enriquecedora que permite uma conexão especial entre as sapatilhas e o solo que as sustenta.

No início do Verão, a ASE fez uma visita à parte inicial destes caminhos, com o objectivo de compreender o estado actual dos mesmos, dois anos após o incêndio que devastou uma dimensão significativa deste Vale. A subida pela encosta, que nos leva até à Fraga Grande, o ponto mais elevado do trajecto, permitiu-nos ter uma perspectiva da força da natureza, quando se permite que esta se deixe entregue a si mesma.

É com tristeza que constatamos o desprezo e o abandono que as veredas do Vale do Beijames têm recebido dos responsáveis pela sua manutenção. A degradação e a falta de cuidado de que têm sido vítimas faz destes percursos um dos principais aspectos que mais lamentamos neste Vale nos dias de hoje. Ao longo da época alta, a ASE teve conhecimento das experiências no Beijames de vários visitantes que procuraram a Serra da Estrela como destino de Verão. Uns, pela incerteza, dirigiram-se ao local, optando por não fazer o trilho; outros, pela curiosidade, exploraram algumas centenas de metros, voltando para trás; e poucos, pela força de vontade e persistência, alcançaram (apenas) o topo do Vale, lamentando a falta de manutenção ao longo de todo o caminho. A falta de consideração pelas veredas, manifestada através da ausência de manutenção e de cuidados, revela que não se trata apenas de uma desconsideração pelas pessoas que nela pretendem caminhar; mais do que isso, trata-se de uma falta de visão pronunciada relativamente aos benefícios para a população de Verdelhos, bem como para com a própria montanha e a fauna e flora a ela associadas.

Mas nem tudo é triste. É com agrado que se verifica o crescimento de algumas árvores, plantadas outrora em iniciativas organizadas pela Associação e, na verdade, continuam a acumular-se, com uma frequência animadora, novos motivos para que se invista neste Vale com a dignidade que ele merece.

A azinheira faz o seu papel, tal como todas as outras árvores. E assim como eles, façamos também o nosso. A luta não é contra o desenvolvimento das plantas que se colocam no meio do caminho, mas sim com a ausência de manutenção, que permite esse crescimento descontrolado. Acreditamos na aliança entre a natureza e as pessoas, certos de que a montanha, essa, continua bonita e paciente, de peito aberto para nos abraçar junto a si.

 

Link de acesso à divulgação das veredas (autoria de Azores4Travel)

 
 
 

 

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