Revista Zimbro
by Amigos da Serra da Estrela
 

2024-07-18

Sonhar não é mau!

Sonhar não é mau!

 

Palavras chave

aldeias  Santiago  
 

O que pode não ser bom é procurar levar os sonhos à prática, sem acordar.

 

Recentemente, foi anunciado, com pompa e circunstância (dado o relevo que teve na imprensa), “o maior percurso pedestre circular do Mundo” o qual, de acordo com o mentor do projecto, Palmilhar Portugal, Ricardo Bernardes, “pretende dar a volta ao país em 3000 quilómetros de trilhos que atravessarão uma centena de concelhos”, através de rotas ao longo do litoral e linha de fronteira do norte ao sul do território.

Num país que faz gala em promover os “Caminhos de Santiago” de uma maneira de fazer inveja aos nossos vizinhos espanhóis, temo que o anunciado projecto não passe disso mesmo, ou, então, venha a revelar-se um completo fracasso. Este texto pretende isso mesmo, apelar à reflexão de quem está envolvido na sua concretização, para que, a ser levado por diante, não venha a gorar-se em mais um projecto falhado onde muito dinheiro poderá vir a ser consumido como tem acontecido com tantos outros.

Não fundamento a minha análise no vazio das ideias, já que dei início no país à criação de percursos, apresentei a primeira grande rota baptizada (não por mim) como GR33 e que se veio a revelar um autêntico fracasso, precisamente, porque não foram levados à prática por quem teve o papel quer na sua candidatura quer na sua execução, de alguns detalhes que refuto fundamentais: o envolvimento das comunidades locais; a qualidade do traçado (que optou mais por satisfazer algumas localidades que o propósito do percurso – o rio Zêzere). E apenas tem um pouco mais de 300 quilómetros, quanto mais 3.000!

“São 370km da nascente à foz de um dos rios mais selvagens de Portugal. Um desafio desportivo, para fazer a pé, de bicicleta ou de canoa. Uma imersão profunda na diversidade natural e cultural que faz do vale do rio Zêzere uma paisagem única no país.”

Uma outra, a GR22, a das Aldeias Históricas, a maior das rotas portuguesas, deve ter sido um investimento brutal para o resultado esperado. Seria um projecto onde não perderia um segundo por não ter interesse, quer para para as Aldeias referenciadas, quer como interessante do ponto de vista dos caminhantes, melhor dizendo, do “mercado” turístico do pedestrianismo, até mesmo das bicicletas (mas esta é uma área que não domino e, portanto, fico-me por aqui). Seria interessante saber qual tem sido a frequência de caminhantes, a sua motivação e poder de compra para se alojar num dos alojamentos disponíveis nas aldeias promovidas.

Uma vez que todas as Aldeias Históricas estão servidas por uma boa rede de estradas, parece-me que a aposta, o investimento, deveria ter sido feito na criação de percursos circulares, em cada uma das povoações, de maneira que os potenciais visitantes pudessem beneficiar dessas infraestruturas para visitar a região circundante às mesmas, permanecendo assim por um período mais dilatado de tempo em cada uma, em vez de o “desperdiçar” entre aldeias, dormir uma noite, e voltar a partir. Realmente, percorrer 600 quilómetros para visitar aldeias, num país marginal da Europa, com 11 mihões de habitantes a usufruir dos salários europeus mais baixos, as seis centenas de quilómetros a fazer serão mesmo para uma mancha marginal de endinheirados que Portugal não tem e que o resto da Europa procurará. Rótulos e selos de qualidade não deverá ser a tarefa mais complicada de se obter.

“A GR22 –  Aldeias Históricas  que liga as 12 Aldeias Históricas de Portugal por etapas, num percurso circular de cerca de 600 quilómetros, possui o selo Leading Quality Trails – Best of Europe, atribuído pela European Ramblers Association, uma certificação que destaca os melhores destinos de caminhada na Europa, através de critérios como a sustentabilidade, o nível de experiência proporcionado ao utilizador, a qualidade do seu traçado e a sua riqueza cultural e natural. Encontra-se igualmente homologada como Grande Travessia de BTT pela Federação Portuguesa de Ciclismo. A par da monumentalidade cultural, na GR22 também percorrerá alguns dos mais belos parques naturais e de Portugal, classificadas como Património Mundial da UNESCO: o Parque Natural do Douro Internacional e Parque Arqueológico do Vale do Côa, o Parque Natural do Tejo Internacional e o Parque Natural da Serra da Estrela. Desfrute ainda das praias fluviais, da tranquilidade e torne-se um conquistador de experiências inusitadas. A GR22 na modalidade pedestre sofreu algumas alterações pontuais de traçado pelo que, caso estejam interessados em percorrer toda a sua extensão, deverão seguir o caminho disponível. Sempre que se aventurar na GR22, aconselhamos a utilização de GPS.”

À margem de tudo o que foi escrito, devo dizer que a informação disponível na internet é excelente e disso podemos orgulhar-nos dos profissionais que o país tem.

Oxalá o presente texto leve os mentores do maior circuito pedonal do país, com os seus 3000 quilómetros, a ponderar devidamente a sua justificação. O traço a vermelho, da imagem de Portugal Continental, que ilustra o texto tem 2002 quilómetros, o que significa que teremos de contar com muitas mais curvas para conseguir a meta anunciada.

De uma coisa temos a certeza: os percursos construídos pela ASE têm sido considerados excelentes pelos seus utilizadores. Reconhecemos, porém, a nossa falta de jeito para apresentar candidaturas e ver-nos envolvidos por projectos de milhões. Daí que o projecto, em banho de Maria, do “Tour da Serra da Estrela”, aquele que do nosso ponto de vista pode catapultar a região para o exterior, se mantenha nesse limbo, à espera do interesse das autarquias e de uma maior dinâmica da UBI. É que o tem vindo a ser feito na Serra da Estrela, ao nível dos percursos é tão mau que dificilmente irão sobreviver por muito tempo sem que passem a ser notícia pelos piores motivos, como já aconteceu e será feita referência nesta edição da revista Zimbro.

E que dizer das iniciativas que vamos fazendo, no sentido de oferecer projectos ambiciosos e de baixo investimento, mas que não têm merecido a mínima receptividade das entidades contactadas.

Será que o problema está em fazermos as coisas de borla?

 
 
 

 

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